Realizado a quatro mãos por Walter Salles e Daniela Thomas, “Linha de Passe” é um primor do cinema, da narrativa e – o mais importante – da emoção.
A sinopse sugere “mais um filme brasileiro sobre a miséria” mas não é nada disso. “Linha de Passe” é um filme sobre limites. O argumento acompanha simultaneamente a trajetória de cinco personagens, vivendo na periferia paulista, cada membro desta família procura a sua própria solução para tentar resolveras duras consequências de uma vida que se desenrola na linha da pobreza. "A linha de passe", que a qualquer momento os pode pôr fora de jogo.
Toda a família vive situações limite. Denis é quase um marginal. Dario é quase um jogador profissional. Dinho quase tem Fé. Reginaldo é quase um motorista de ônibus. E a equipa de futebol de Cleuza está quase a passar para a segunda divisão.
Estar o tempo todo à beira de algo que pode (ou não) acontecer a qualquer minuto, é a chave-mestra deste filme. Pode-se dizer até que é um filme de suspense. Não o suspense colonizado serial killers e facas atrás de cortinados, mas o da agonia que todo o brasileiro vive diariamente nas ruas. Do medo de não voltar para casa. Do medo de não conseguir nada na vida. Do medo de não conseguir sobreviver dignamente.
O precioso conteúdo do filme é emoldurado por uma realização preocupada com todos os detalhes e capaz de desenvolver os cinco diferentes protagonistas de uma forma coesa e corpórea. Walter Salles e Daniela Thomas conseguem assim criar na plateia uma forte empatia pelas situações vivenciadas por todos eles. É inevitável torcer por este ou por aquele, quando não por todos.
Curiosamente a beleza dos personagens não é física, têm todos (excepto talvez a criança) as marcas que a pobreza deixa nos seres humanos. Não é uma pobreza estética, é real e é isso que os actores parecem, pessoas reais em situações limite, sem nenhuma beleza física que nos cative. Linha de passe cativa sobretudo por isso. Um filme onde "nada se desenrola" mas onde tudo acontece. Um filme de emoções.